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APRENDER A FALAR E A CALAR

“Quem deseja respeito alcançar, aprende a ver, ouvir e calar.”

Essa frase, de autoria de Esse Capelli, escritor espírita de escol que já publicou mais de 70 livros – todos de grandes ensinamentos morais, faz-nos refletir sobre a importância da fala edificante e, mais ainda, do silêncio, em nossas vidas.

Ao pesquisarmos sobre a evolução histórica de nossa civilização, descobrimos que os primeiros hominídeos não falavam, apenas produziam sons. No instante em que o processo evolutivo permitiu ao homem andar de pé e as suas mãos deixaram de servir como auxílio na locomoção, iniciou-se a produção de sons mais refinados, que, aos poucos, deram origem à nossa fala.

A capacidade de exprimir o pensamento através de palavras serve para agregar valor às coisas, às emoções e aos acontecimentos, em uma sociedade que nomeia tudo o que existe e acontece a sua volta. Quando falamos, permitimos ao outro que conheça nossos pensamentos, sentimentos, necessidades e passamos, também, a conhecer o nosso semelhante. É através da palavra falada que influenciamos e provocamos as mudanças necessárias para construir uma vida melhor.

O comportamento verbal tem inúmeras funções, sendo algumas delas: possibilitar que experiências sejam passadas de geração a geração; expressar os nossos sentimentos; auxiliar o mestre a dividir o conhecimento com seus alunos; permitir que recitemos um lindo poema; facilitar a comunicação de sinais de alerta; sussurrar palavras doces a um bebê; repreender alguém, quando isso se fizer necessário; dar boas risadas; cantar; consolar e fortalecer o nosso irmão que passa por dificuldades.

Alguns estudiosos da área consideram que a comunicação é uma das mais importantes necessidades humanas depois da sobrevivência física. Na opinião deles, o homem necessita da comunicação do mesmo modo que o corpo requer água e alimento para um bom funcionamento.

Por sua vez, grande parte de fonoaudiólogos e neurolinguistas defendem que somos do tamanho da comunicação que conseguimos estabelecer no meio em que vivemos, seja social ou profissionalmente. Para eles, um bom comunicador é aquele que transmite suas mensagens com clareza e objetividade, impostando bem a voz e prendendo a atenção do interlocutor. Mas, para comunicarmos bem, será que apenas isto nos basta? Veremos que não.

Antes de avançarmos, queremos ressaltar que a nossa intenção não é incentivar que permaneçamos mudos, ou, então, com medo de falar com as outras pessoas, muito pelo contrário.

As palavras são muito poderosas.

De acordo com Emmanuel, em Vinha de Luz (psicografia de Chico Xavier): “Os elementos psíquicos que exteriorizamos pela boca são potências atuantes em nosso nome, fatores ativos que agem sob nossa responsabilidade, em plano próximo ou remoto, de acordo com nossas intenções mais secretas”.

Desta maneira, quando as palavras saem de nossa boca, elas têm o potencial de criar ou dissipar estresse, cativar ou afastar pessoas, conquistar ou destruir sonhos, provocar paixão ou abrir feridas que duram por uma ou mais vidas. É aquele conhecido provérbio: “Há três coisas que nunca voltam atrás: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida.”

Tudo depende de nossa habilidade de lidar com as palavras: no tempo, dose, forma e entonação adequadas.

Uma recomendação interessante é falar apenas o necessário, colocando amor em cada palavra que sai de nossa boca; eliminarmos a ironia de nossos comentários; escolher, com inteligência, a palavra certa para o momento exato, sempre cuidando para não ferir ou humilhar o semelhante e nunca esquecer que não precisamos gritar para expor nosso ponto de vista.

A fala é a forma de comunicar mais rápida, pois, através da escrita, por exemplo, o escritor tem a possibilidade de pensar, pelo menos um pouco, antes de escrever, porém, a palavra chega à boca e sai… E aí está o grande problema.

O ilustre Jávier Godinho, nosso confrade, ocupante da cadeira nº 10 da Academia Espírita de Letras do Estado de Goiás (ACELEG), em uma publicação no jornal Diário da Manhã, datada de 16/9/15, assim nos alertou: “As pessoas não imaginam as forças que liberam, positivas ou negativas, ao simples se comunicar com os outros, através da voz. Há expressões que abençoam e expressões que amaldiçoam. Um simples bom dia, boa tarde e boa noite, dados do fundo da alma, fazem muito bem àqueles que o recebem e, principalmente, a quem os oferece”.

O que precisamos é justamente aprender o que, quando e de que maneira devemos dirigir as palavras aos nossos companheiros de jornada evolutiva.

Um pai, por exemplo, que, ao invés de ensinar a maneira correta de fazer-se algo, grita com o seu filho: – SEU BURRO! VOCÊ NUNCA APRENDE NADA! Pode causar traumas naquele ser em formação, que irão refletir-se por toda a vida dele.

O “amigo” que incentiva o outro, dizendo: – Você tem que trair sua esposa! Todo homem trai. Isso é normal. Se você não trair, ela irá te trair, caso já não o tenha traído. A fidelidade acabou nos dias de hoje. Imagine qual será a sua responsabilidade, não só nesta vida, por estas palavras indevidas e infelizmente tão comuns nos dias atuais.

Um cônjuge que critica seu parceiro todo o tempo, exclamando: – Ele é um péssimo pai e marido! Ou: – Ela é feia e chata! Será que ainda existe algum amor e respeito entre eles?

E aquela pessoa que só reclama de tudo e de todos? Para nos auxiliar neste caso, citamos uma orientação de Clarêncio a André Luiz, retirada do Cap. 6 do belíssimo livro Nosso Lar: “Aprenda a não falar excessivamente de si mesmo, nem comente a própria dor. Lamentação denota enfermidade mental, de difícil tratamento. É indispensável criar pensamentos novos e disciplinar os lábios. Somente conseguiremos equilíbrio, abrindo o coração ao Sol da Divindade.”

Agora, a pior vilã, quando nos referimos ao ato de falar: a fofoca. Ela é capaz de destruir famílias, amizades, empresas, vidas. O fofoqueiro faz intrigas, inventa, distorce o que ouviu e está repassando, age sutilmente para conseguir o que deseja. Aos olhos do homem, pode cometer os crimes de calúnia e difamação. Em relação à Justiça Divina, será, com certeza, um grande devedor. Senão devemos julgar ninguém, imaginemos este ser que, além de julgar e condenar, espalha sua sentença a esmo, para todos a sua volta.

Amigos leitores, como solucionar tudo isso? E o que é mais difícil, aprender a falar ou a calar?

Todos esses exemplos corriqueiros citados denotam a grande falta de caridade que ainda insiste em persistir em nosso mundo de provas e expiações.

De acordo com O Evangelho Segundo o Espiritismo (Cap. XIII, item 9): “A caridade moral consiste em se suportar uns aos outros, e é o que menos fazeis nesse mundo inferior onde estais encarnados no momento. Há um grande mérito, crede-me, em saber se calar para deixar falar um mais tolo; e ainda aí está um gênero da caridade. Saber ser surdo quando uma palavra de zombaria escapa de uma boca habituada a escarnecer; (…) eis um mérito, não de humildade, mas de caridade; porque não adotar os erros de outrem é caridade moral.”

Para corroborar, o magnífico espírito André Luiz, no livro Obreiros da Vida Eterna, Cap. 14, esclarece-nos: “No estado atual da educação humana, é muito difícil alimentar, por mais de cinco minutos, conversação digna e cristalina, numa assembleia superior a três criaturas encarnadas.”

Deste modo, um grande auxílio para falarmos cordialmente com nossos semelhantes é compreender a difícil tarefa de ouvir e, para isso, precisamos aprender a calar. Num primeiro momento, a nossa boca, isto já ajudará muito e, posteriormente, a nossa mente, parte esta um pouco mais complexa, para a maioria de nós.

Há muita necessidade de silêncio nos dias atuais. As pessoas ansiosas por se fazerem ouvir falam cada vez mais alto, como se isso bastasse para que os outros as escutassem. Poucos indivíduos ouvem a própria voz e analisam seus pensamentos antes de exteriorizá-los, pois o hábito de meditar antes de expor uma opinião ou um julgamento é muito pouco cultivado em nossa sociedade. E isso tem sido motivo de desarmonia e intrigas, de mal-entendidos e hostilidades.

Saber calar, saber ouvir, ser senhor de suas palavras e de seus sentimentos é um desafio que merece ser pensado.

Quando aprendermos a silenciar, passaremos a ferir menos os nossos irmãos, a mantermo-nos mais equilibrados, deixando de plasmar ideias infelizes que são aproveitadas pelos opositores daquele que é julgado, cultivaremos menos mágoa e angústia em nossos corações e entenderemos que a arte do diálogo não é um simples despejar de palavras em direção ao ouvinte.

Comecemos, aos poucos, a aprender a ouvir, com mais atenção, os nossos filhos, os nossos pais e aqueles, um pouco mais evoluídos do que nós, com os quais sempre temos a oportunidade de aprender muito. E também a falar, em nosso dia a dia, palavras e assuntos mais edificantes, através da doutrinação de nossa mente, bem assim a afastarmos das fofocas e dos fofoqueiros, os quais, em pouco tempo, ao perceberem que não mais nos interessamos em saber e cuidar da vida dos outros, distanciar-se-ão de nós.

Este novo comportamento irá trazer benefícios não só ao nosso espírito e à nossa mente, mas, também, ao nosso corpo físico. A este respeito, o venerável Espírito Bezerra de Menezes, no livro Nas Fronteiras da Loucura, lançado em 1982, em seu capítulo 30, nos ensina: “Sabe-se, hoje, cientificamente, que a boa palavra proferida com entusiasmo, faz que o cérebro e o hipotálamo secretem uma substância denominada endorfina, que atua na medula e bloqueia a dor, tal como ocorre na acupuntura… Assim, ouvir e falar de forma positiva, sorrir com natural e justa alegria, faz muito bem a todas as pessoas.”

E será muito difícil mudar? Aprender a falar e a calar?

A questão 909 de O Livro dos Espíritos nos dá uma bela lição.

Poderia sempre o homem, pelos seus esforços, vencer as suas más inclinações?

Sim, e, frequentemente, fazendo esforços muito insignificantes. O que lhe falta é a vontade. Ah! Quão poucos dentre vós fazem esforços!

Para finalizar, deixamos um belíssimo texto, que resume e nos orienta sobre tudo o que foi aqui tratado, do livro Coragem e intitulado Nos Domínios da Fala, do espírito Emmanuel, psicografado por Chico Xavier:

Não somente falar, mas verificar, sobretudo, o que damos com as nossas palavras.

Automaticamente, transferimos estados de alma para aqueles que nos ouvem, toda vez que damos forma às emoções e pensamentos com recursos verbais.

Terás pronunciado formosos vocábulos, selecionando frases a capricho, no entanto, se não as tiveres recamado de bondade e entendimento é possível que tenhas colhido apenas indiferença ou distância nos companheiros que te compartilham a experiência. Ainda mesmo hajam sido as tuas expressões das mais corretas e das mais nobres, gramaticalmente considerando, se nelas colocaste quaisquer vibrações de pessimismo ou azedume, ironia ou insinceridade, elas terão sido semelhantes a recipientes de ouro que derramassem vinagre ou veneno, ferindo ou amargurando corações ao redor de ti.

Isso ocorre porque, instintivamente, a nossa palavra está carregada de nosso próprio espírito, ou melhor, insuflamos os próprios sentimentos em todos aqueles que nos prestem atenção.

À vista disso, analisemo-nos em tudo o que dissermos.

Conversa é doação de nós mesmos. Opiniões que exteriorizemos são pinceladas para a configuração de nosso retrato moral. Mais que isso, o verbo é criador. Cada frase é semente viva. Plantamos o bem ou o mal, a saúde ou a enfermidade, o otimismo ou o desalento, a vida ou a morte, naqueles que nos escutam, conforme as ideias edificantes ou destrutivas que lhes imponhamos pelos mecanismos da influenciação, ainda mesmo indiretamente.

Balsamizarás as feridas dos que se encontrem caídos nas trilhas do mundo, entretanto, que será de nossos irmãos horizontalizados na angústia se não lhes instilamos no coração a fé necessária para que se levantem na condição de filhos de Deus, tão dignos e tão necessitados da bênção de Deus, quanto nós?

Estudemos a nossa palavra, entendendo-lhe a importância na vida.

Diálogo é o agente que nos expõe o mundo íntimo.

O verbo é o espelho que nos reflete a personalidade real para julgamento dos outros.

Falarás e aparecerás.

Camilla Arruda e Marcelo Arruda, espíritas, palestrantes do Grupo de Edificação Espírita/GEE e membros das cadeiras nº 21 e 22 da Academia Espírita de Letras do Estado de Goiás/ACELEG, respectivamente.

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