Plano para ocultar o anúncio do ressurgimento de Jesus.
Enquanto as mulheres iam, eis que alguns da guarda foram à cidade e contaram aos principais sacerdotes tudo o que havia acontecido. Reunindo-se eles em conselho com os anciãos, deram aos soldados uma grande soma de dinheiro, recomendando-lhes:
“Direis: os seus discípulos vieram de noite e o roubaram enquanto nós estávamos dormindo. Se isso chegar aos ouvidos do governador, havemos de persuadi-lo e vos livraremos de qualquer pena”.
Então eles, recebendo o dinheiro, fizeram de acordo com as instruções recebidas. E esse boato se propalou entre os judeus até o dia de hoje. (Mateus, 28:11-15).
O Evangelho de Mateus é o único a narrar esse episódio. Mateus escreveu o seu Evangelho com o propósito maior de informar e de conscientizar os judeus a respeito da natureza messiânica da missão de Jesus. Nesse sentido, surge a seguinte indagação: De que modo Mateus soube desse acordo ilícito entre o conselho de sacerdotes e anciãos e os soldados que lhes anunciaram a verdade a respeito do que ocorrera no sepulcro de Jesus?
Não se deve olvidar que no Sinédrio, além de José de Arimateia e de Nicodemos, existiam outros simpatizantes e discípulos de Jesus. Esse ardiloso pacto foi revelado aos seguidores do Cristo, causando-lhes comiseração e o aumento de prudência diante dos adversários, autores da mentira hedionda. No entanto, se até os dias de hoje há judeus que não acreditam no Jesus Messias, também há os judeus messiânicos, ou seja, aqueles que acreditam em Jesus como sendo o Filho de Deus, o Messias esperado.
Os soldados receberam grande soma de dinheiro dos religiosos para contarem que foram os discípulos de Jesus que moveram a pedra do sepulcro e não um anjo e que isso ocorreu enquanto dormiam e não porque ficaram assustados e simularam que estavam a dormir diante do acontecimento excepcional e incompreensível para eles.
O suborno impediria que os soldados narrassem a verdade aos judeus e às autoridades romanas, as quais estariam indiferentes aos antagonismos religiosos dos judeus e por isto as autoridades judaicas não encontrariam dificuldades em apoiar a versão dos soldados diante de algum questionamento de Pôncio Pilatos.
Por outro lado, diante dessa situação, indaga-se: Se os soldados não aceitassem o suborno do Conselho o que ocorreria? Provavelmente seriam chamados de mentirosos, seriam perseguidos, acusados de discípulos do Cristo e até de violadores de túmulos. Além disso, poderiam perder o emprego por conta do prestígio que o Sinédrio desfrutava junto ao governo romano. Afinal, a influência do Sinédrio junto ao Império foi a principal razão de Pilatos ter lavado as mãos e deixado Jesus ser crucificado por medo de denúncias junto ao imperador que o levaria a algum tipo de desgaste e até a perda do cargo de Procurador, conforme as ameaças que recebera de alguns dos sacerdotes antes e durante o julgamento de Jesus. Ainda que não se possa afirmar se a aceitação do suborno foi por ganância ou por medo é justo pensar que o medo dos soldados foi maior do que suas ganâncias e a dignidade de suas consciências. Diante dessas fragilidades morais do ser humano é que muitos governantes, autoridades, empresários e poderosos do mundo têm se servido de suas posições para enganar, corromper, oprimir, maltratar, humilhar e até matar tantos que sofrem ou que se opõem aos seus objetivos iníquos.
Ao seguir a narrativa de Mateus, os soldados não deveriam inicialmente contar às autoridades religiosas o que se passou e sim para os seus superiores hierárquicos. No entanto, o Evangelho não explicita de que modo esses soldados chegaram até às autoridades judaicas, mas também não se pode descartar a possibilidade de terem sido orientados por seus superiores a narrarem o fato aos sacerdotes.
A inverdade surge da ignorância em face de todas as suas consequências letais. A mentira sempre busca proteger algum interesse egoísta de natureza material, não raras vezes, com a intenção de causar algum dano moral ou material para quem o promove e para outrem. Além disso, mesmo diante do fato incontestável da ressurreição espiritual de Jesus, os principais sacerdotes e os anciães não queriam ser acusados de serem os responsáveis pela morte ignominiosa do Messias.
Independente das artimanhas, das fragilidades humanas e dos posicionamentos religiosos, a Verdade a respeito do Cristo não pode ser obnubilada. “Porque nada há de oculto que não venha a ser revelado, e nada em segredo que não seja trazido à luz do dia” (Marcos, 4:22).
(Emídio Brasileiro é membro da Academia Espírita de Letras do Estado de Goiás, da Academia de Letras de Goiânia e da Academia Aparecidense de Letras)